sábado, 25 de dezembro de 2010

RENATO RUSSO TINHA RAZÃO - Uma reflexão de Natal

Com esta afirmação, não me refiro a todas as canções que ele escreveu, seja com a Legião Urbana ou em sua carreira solo.

Obviamente, não me refiro também ao estilo de vida que ele levou.

Sequer penso em uma canção completa.

Refiro-me apenas a uma frase, um dos versos de “Há Tempos”.

“Nem os santos têm ao certo a medida da maldade”.

Sempre achei que esta frase era perfeitamente aplicável ao contexto da Igreja.

A princípio, ao acompanhar  o processo de revisão de usos e costumes dentro da denominação a que pertenço (um processo necessário, para o bem da integridade teológica e intelectual da denominação - e qualquer um que já tenha presenciado a esterilidade de uma discussão sobre usos e costumes travada entre evangélicos sabe que não estou exagerando!), relacionei-a ao argumento dos tradicionalistas: parecia que os santos estavam perdendo os paradigmas da maldade, ao abrir mão das regras pré-estabelecidas acerca de santidade.

Todavia, diante da complexidade do problema do pecado enquanto realidade humana, corrompendo tudo aquilo que o homem faz e é, descobri que a frase tinha um poder e uma profundidade ainda maior - posto que verdadeira.

Qualquer um que tenha se quedado atônito diante da própria pecaminosidade sabe do que estou falando.

A pecaminosidade humana é um problema tão profundo (ou melhor, nos torna um problema tão profundo) que não pode ser tratado de maneira banal, como uma simples mensuração - e é esta a estratégia dos fariseus: acreditar que a problemática humana pode ser resolvida através de regras e ritos.

E a história da Igreja atesta que os homens mais piedosos e consagrados a Deus eram sempre os mais sensíveis e cônscios de sua própria pecaminosidade, uma percepção que aumentava na mesma medida em que cresciam na fé.

Neste sentido, os santos nunca conseguirão ter ao certo a medida da maldade - pois sabem estar diante de um inimigo terrível!

Só podem orar como Davi:

“Quem pode entender os próprios erros? Expurga-me tu dos que me são ocultos” (Salmo 19.12).

É somente com a percepção da própria decadência que podemos compreender e apreciar a obra salvadora de Cristo, da manjedoura até a cruz, de maneira apropriada.

Sim, pois em caso contrário, “Salvação” torna-se um termo vazio!

É esta a percepção do Natal feita pelos autojustificados...

Isto é o Natal: para grandes pecadores, fez-se NECESSÁRIO o nascimento de um grande Salvador!

E assim, com gratidão pela provisão que o Natal significa, propiciada pela posse de seu significado, podemos celebrá-lo de forma realmente feliz.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

DENÚNCIA (III)



Incluso na série "Denúncia" - até eu encontrar uma boa razão bíblica que fundamente a distribuição (gratuita, espero) do "tijolo da edificação".

***

PS: haverá também uma reunião para a entrega do cimento da edificação? É o mínimo a se esperar, diante de tal postura teológica.

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

SÉRIE SABERES ESSENCIAIS À VIDA (II): FAZER A RODA DA HISTÓRIA GIRAR A SEU FAVOR

Falar em História é falar acerca de uma forma de interpretar a realidade. Dependendo dos aspectos enfatizados pelo historiador (por exemplo, a macro-história dos fatos oficiais ou a micro-história do cotidiano; os feitos de indivíduos ou de comunidades), temos diferentes maneiras de conceber a História.

Isto ocorre principalmente com o referencial interpretativo da História: Marx acreditava que a História podia ser explicada em termos econômicos. A concepção do iluminismo do século XVIII era totalmente racionalista, descartando a possibilidade de intervenções sobrenaturais no cenário humano.

A concepção bíblica de que Deus conduz a História para um clímax que cumprirá o Seu bom propósito para a humanidade (visão teleológica da História, do grego telos - meta, objetivo) serviu como inspiração e pretexto para a concepção desenvolvimentista da História, hoje em xeque, devido à constatação dos crimes do colonialismo, seu produto direto, e à ausência de um paradigma claro acerca do que significa "progresso".

Mas a concepção que desejo destacar neste post é uma antiga maneira de olhar a vida e a História, que influenciou fortemente os povos andinos de outrora: a concepção cíclica da História.

Dentro desta concepção, a História é movida por um ciclo inevitável de nascimento, apogeu e declínio - e este movimento explica o surgimento e o desaparecimento de impérios, nações e culturas.

Embora esta concepção cíclica não seja geralmente adotada como modelo interpretativo da História macro nos dias contemporâneos, ela é larga e popularmente utilizada para interpretar os acontecimentos do dia-a-dia, a História micro. Mesmo o Pastor Ricardo Gondim, famoso por sua oposição a toda espécie de determinismo, por exemplo, utilizou categorias extraídas desta concepção em uma entrevista à revista Eclésia para abordar a decadência do movimento evangélico.

A vida, em todos seus aspectos, estaria sujeita a um ciclo inevitável de surgimento, apogeu e declínio.

Aliás, não foi assim que definiram para nós o que é um ser vivo, nas séries primárias? Alguém que nasce, cresce, reproduz-se e morre?

Entender a História como um ciclo é conceber uma engrenagem que atrela a existência humana (relacionamentos, projetos, empreendimentos e o próprio ser em si) a si.

É a quintessência do fatalismo.

Conformismo e passividade são os filhos do fatalismo.

Mas as coisas não precisam ser assim.

A concepção bíblica da História mostra que Deus não permitirá que ela se mova em torno de si mesma, mas que Ele a conduzirá em triunfo. Isto é um incentivo e um convite ao agir responsável do ser humano, elevado ao status de colaborador de Deus em Seu agir na História.

Por que é tão importante aprender a fazer a roda da História girar a nosso favor?

Porque é a chave para que nos liberta da prisão da passividade, fazendo-nos ir à luta contra os aspectos da realidade  que se opõem à glória de Deus e ao bem-estar do homem, nos tornando agentes responsáveis e criativos de nossa própria História - tanto macro quanto micro.   

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

"POR ESTAS COISAS VEM A IRA DE DEUS..." Pô, mas logo por ESTAS coisas!?

“Assim, façam morrer tudo o que pertence à natureza terrena de vocês: imoralidade sexual, impureza, paixão, desejos maus e a ganância, que é idolatria. É por causa dessas coisas que vem a ira de Deus sobre os que vivem na desobediência as quais vocês praticaram no passado, quando costumavam viver nelas” (Colossenses 3.5-7, NVI).

A epístola à igreja em Colossos é um texto apologético, visando prevenir aquela comunidade quanto ao risco de abrir mão de sua suficiência em Cristo seduzida pelo apelo do racionalismo, de um misticismo falso e/ou do legalismo.

O capítulo 3 expõe qual é o aspecto prático desta suficiência em Cristo enquanto expressão de vida de fé – e introduz este assunto com uma recordação acerca do estilo de vida pregresso daquela comunidade, a fim de contrastá-lo com o caminhar em Cristo.

Imoralidade sexual, impureza, paixão, desejos maus e a ganância – assim viviam aquelas pessoas e Paulo foi enfático em afirmar que isto desperta a ira de Deus.

Fico pensando em como nossa sociedade reagiria a esta afirmação, que condena especificamente os comportamentos mais valorizados em nossa cultura; em suma, tudo o que o brasileiro acha mais divertido – e o Carnaval, os bailes funk e a pornogratização da mídia não me deixam mentir!

Alguém até poderia questionar: “Mas por que a ira de Deus vem justamente sobre ESTAS coisas? Que implicância é esta”?

Deus pode ser facilmente tachado como estraga-prazeres após a leitura de Colossenses 3.5-7.

Abaixo, apresento uma breve análise etimológica de cada termo destacado no texto:

• Imoralidade sexual (gr. porneia): a não-submissão da sexualidade ao Deus que a criou.

• Impureza (gr. akatharsian): a adoção da malícia como estilo de vida, o que impossibilita o respeito e a decência.

• Paixão (gr. pathos): quando a ânsia de viver intensamente desintegra o ser.

• Desejos maus (gr. epithumias kaken): a deificação do desejo, onde nada lhe deve ser negado, equivalente à deificação narcisista e maligna do eu.

• Ganância (gr. pleoneksian): quando o acúmulo de bens é visto como o fim máximo da existência.

Mas creio que a melhor forma de compreender o quão justa é a ira de Deus contra o estilo de vida sacralizado pela sociedade contemporânea é observar os efeitos por ele causados, procurando suas vítimas.

Entendo que a ira de Deus contra a imoralidade sexual é justa quando vejo os filhos das baladas crescerem como consequências indesejadas de um momento de prazer.

Entendo que a ira de Deus contra a impureza é justa quando vejo uma pessoa ser reduzida á condição de objeto sexual, procedimento assim sustentado pela mídia e pelo mercado.

Entendo que a ira de Deus contra a paixão é justa quando vejo famílias e relacionamentos arrasados, pela falta de consideração de alguém que argumentou querer “viver de verdade”.

Entendo que a ira de Deus contra a glorificação do desejo é justa quando vejo o poder destrutivo do desejo desvinculado da ética e do compromisso com o próximo.

Entendo que a ira de Deus contra a ganância é justa quando vejo a corrupção minar verbas que deveriam ser destinadas ao benefício público ou quando vejo o estilo de vida subumano dos workaholics contemporãneos.

Nossos valores estão na contramão do projeto de Deus para a espécie humana – estão na contramão da humanização.

E assim entendemos que a ira de Deus é Sua denúncia da nossa falta de discernimento, que nos leva a hesitar em depor nossos falsos ídolos e descartar suas falsas promessas de realização.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

UM CÂNTICO MAL-EDUCADO

Meu inglês não é fluente – mas ainda assim creio que não seria honesto de minha parte escrever um artigo sobre o famosíssimo hino Sossegai desconsiderando a composição original. Sendo assim, com o intuito de descobrir nuances na poesia de Mary Ann Baker que poderiam ter se perdido na adaptação para o português, atrevi-me a traduzi-lo, mesmo reconhecendo que cometeria inevitáveis tosquices lingüísticas. Mas, por favor, tenha paciência e siga comigo nesta reflexão.

CALM
CALMA

Master, the tempest is raging! The billows are tossing high!
Mestre, a tempestade está furiosa! As ondas estão se agitando às alturas!

The sky is o’er shadowed with blackness, No shelter or help is nigh;
O céu está sombreado com trevas, não há abrigo ou ajuda por perto

Carest Thou not that we perish? How canst Thou lie asleep,
Tu não te preocupas que estamos em perigo? Como podes tu ficar adormecido

When each moment so madly is threatening, A grave in the angry deep?
Quando a cada momento tão loucamente é prenunciado um túmulo nas profundezas furiosas?
 
Chorus
Coro
 
The winds and the waves shall obey My will,
Os ventos e as ondas deverão obedecer Minha vontade

Peace (Peace, be still!), be still (Peace be still!)!
Paz, fique calmo!

Whether the wrath of the storm tossed sea,
Seja a ira da do mar agitado pela tempestade

Or demons, or men, or whatever it be,
Ou demônios, ou homens, ou o que quer que seja,

No water can swallow the ship where lies,
Nenhuma água pode tragar o barco onde jaz

The Master of ocean and earth and skies;
O mestre do oceano, da terra e dos céus,

They all shall sweetly obey My will;
Todos eles deverão docemente obedecer minha vontade

Peace be still! Peace be still!
Paz, fique calmo! Paz, fique calmo!

They all shall sweetly obey My will,
Todos eles deverão docemente obedecer minha vontade

Peace, peace, be still!
Paz, fique calmo! Paz, fique calmo!

2. Master, with anguish of spirit I bow in my grief today;
2. Mestre, com angústia de espírito arqueei-me em meu pesar hoje

The depths of my sad heart are troubled; O waken and save, I pray!
As profundezas de meu triste coração estão perturbadas; oh, acorda e salva, eu oro!

Torrents of sin and of anguish Sweep o’er my sinking soul!
Torrentes de pecado e angústia varrem minha alma desmoronada

And I perish! I perish, dear Master; O hasten, and take control!
E eu pereço! Eu pereço, querido Mestre; oh, se apresse e tome o controle!

3. Master, the terror is over, The elements sweetly rest;
3. Mestre, o terror acabou, os elementos descansam docemente

Earth’s sun in the calm lake is mirrored, And Heaven’s with my breast.
O sol da Terra está espelhado no calmo lago e o do céu no meu peito

Linger, O blessed Redeemer, Leave me alone no more;
Demore, Ó abençoado Redentor, não me deixe mais só

And with joy I shall make the blest harbor, And rest on the blissful shore
E com alegria eu farei o bendito porto e descansarei na bem-aventurada costa

 
Mary Ann-Baker (1831-1881) passou pela dor de perder seus pais em tenra idade e seu piedoso irmão, um referencial para ela na fé, ainda na adolescência.

"Sossegai" é o registro da experiência de superação de sua dor.

"Embora nosso choro não fosse 'como outros que não têm esperança' e embora tivesse crido em Cristo desde menina e desejasse sempre viver uma vida consagrada e obediente, tornei-me terrivelmente rebelde a esse desígnio da divina providência. Disse no meu coração que Deus não me amava, nem aos meus. Mas a própria voz do meu Mestre veio acalmar a tempestade no meu coração rebelde e me trouxe a calma de uma fé mais profunda e uma confiança mais perfeita."
 
Tendo escrito a letra para uma aula da Escola Bíblica Dominical sobre a passagem bíblica em que Cristo apazigua a Tempestade (“Esta lição expressou tão vividamente a minha experiência, que este hino foi o resultado”), a autora surpreendeu-se com o sucesso que o hino alcançou, obtendo várias traduções e sendo amado por imensa parte da cristandade.

"Me surpreende muito que este humilde hino tenha atravessado os mares e tenha sido cantado em terras bem distantes para a honra do nome do meu Salvador", afirmou Mary Ann.
 
Como explicar tamanho sucesso, principalmente à luz de versos como “Não se te dá que morramos” (pior no inglês origial, “Carest Thou not that we perish?”, ou seja, “Tu não te preocupas que estamos em perigo?”)?

A razão que explica o sucesso de Sossegai é a mesma razão que explica o sucesso dos Salmos.
 
São textos que relatam a experiência profunda de expor sem reservas ao Senhor o conteúdo do coração – não importa qual seja ele.
 
Expõe-se ao Senhor o conteúdo do coração porque só Ele é capaz de consertá-lo.

Enquanto o cerimonialismo religioso busca se especializar em desenvolver as técnicas rituais adequadas para aproximar o homem convenientemente (e artificialmente) de Deus, Sossegai segue na direção oposta.
 
Isto faz com que os Salmos e cânticos como Sossegai sejam imbatíveis enquanto literatura devocional: eles expressam o profundo anseio humano por Alguém que os ouça e, em triunfo, descobrem que Deus os aceita.
 
A falta de etiqueta de um coração contrito é resultado da não-domesticação do mesmo pelo cerimonialismo religioso.

E enquanto o evangelicalismo contemporâneo tenta negar a realidade da experiência do sofrimento humano e apresentando o retrato de um falso Deus que se interessa pelo dinheiro e cabriolas dos fiéis, a subversão devocional revelada nos Salmos e em Sossegai será necessária, para a salutar adoração e para resguardar a dignidade de Deus, apresentando-O como o pai amoroso que é.

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

PRECISAMOS DE UM CAPITÃO NASCIMENTO GOSPEL?


Quem assistiu "Tropa de Elite 2" percebeu que a grande crítica que o filme faz é acerca do uso criminoso da máquina política, onde a agenda da segurança pública é determinada por interesses eleitoreiros, e não segundo os anseios da sociedade.

No vale-tudo pelo voto o crime acaba tendo utilidade.

Desta vez, a determinação do Capitão Nascimento se fez necessária não mais em um conflito armado com criminosos, mas ao exercer a coragem necessária para denunciar os crimes dos pretensos representantes do povo, cuja relação com o mesmo, em sua sanha corrupta por poder, pode ser definida como parasitismo.

O povo não é nada - apenas uma massa que, manobrada adequadamente, produz o resultado esperado: votos.

Depois de presenciar a postura vergonhosa da maioria das lideranças evangélicas nas eleições deste ano, não pude deixar de me perguntar se a igreja evangélica não estaria necessitando de também um Capitão Nascimento, capaz de confrontar a míope postura política da cristandade, bem como a ânsia de poder daqueles que priorizam mais os títulos eleitorais de suas ovelhas do que suas almas.   

Parei, todavia, estarrecido, ao perceber que isto não é necessário!

O Espírito Santo já cumpre este papel entre nós!

É Ele quem confronta o homem com o seu pecado, chamando-o ao arrependimento.

E certamente Sua denúncia contra o vale-tudo eleitoral tem sido feita, atingindo corações e mentes!

A ausência de mudança simplesmente reflete o endurecimento de tais pessoas.

Resistem Àquele que é  maior que o Capitão Nascimento!

Por Deus, como anda a consciência destes homens?

Sim, pois é perfeitamente possível viver uma fantasia cristã, através da inserção de interesses particulares ímpios numa pretensa definição de "Evangelho".

Não será possível, contudo, fugir do julgamento do Dono do Evangelho: Nem todo o que me diz: Senhor, Senhor! entrará no reino dos céus, mas aquele que faz a vontade de meu Pai, que está nos céus. Muitos, naquele dia, hão de dizer-me: Senhor, Senhor! Porventura, não temos nós profetizado em teu nome, e em teu nome não expelimos demônios, e em teu nome não fizemos muitos milagres? Então, lhes direi explicitamente: nunca vos conheci. Apartai-vos de mim, os que praticais a iniqüidade” (Mateus 7.21-23).
 
Será a maneira que o Mestre usará no último dia para dizer "pede pra sair".

Oremos para que Deus conceda arrependimento a estas pessoas.