terça-feira, 30 de novembro de 2010

SOBRE COMUNISMO E COMUNHÃO

Atribui-se ao filósofo alemão Karl Marx (1818-1883) a idealização do comunismo.

Na verdade, Marx desenvolveu o socialismo, afirmando que o comunismo seria o desdobramento  consumação de sua teoria político-econômica: fiel ao princípio da dialética de Hegel (1770-1831), que concebia a História como um fluxo contínuo de transformação gerado pelo conflito de forças opostas entre si, acreditava que o comunismo seria a consumação de seu projeto socialista para a sociedade*.

O socialismo é, prioritariamente, uma teoria econômica, fundamentada na história das relações econômicas do homem, ou seja, sobre as diferentes maneiras em que a sociedade se organizou para produzir riquezas - os chamados modos de produção.

Marx, juntamente com seu amigo e patrocinador Friedrich Engels (1820-1895) observou uma característica comum a todos os modos de produção registrados pela História (escravismo, feudalismo e capitalismo): os meios de produção (instrumentos necessários para produzir riquezas, como ferramentas, terras e até mesmo o conhecimento) sempre estiveram nas mãos de uma elite, que mantinham seu poder sobre as classes que o sustentavam através de meios próprios de repressão, como a ideologia, que justificava teoricamente a situação vigente (não poucas vezes aliada à religião) e os aparelhos repressores estatais (como o poderio militar e, posteriormente, a escola).

(Por exemplo, a atual sociedade capitalista se estrutura em torno da acumulação individual de capital, meio necessário para a produção de maiores riquezas (através de investimentos, prestação de serviços, etc.), com a chancela de um Estado não-interventor, que resguarda a autonomia econômica de seus cidadãos (razão pela qual este modelo econômico também é chamado de liberalismo – e o neo-liberalismo defende um papel ainda menor do Estado nesta questão). O capitalismo enaltece o individualismo e a meritocracia.)

Mesmo transformações históricas drásticas, como o fim do império romano e o início da Idade Média, mudaram apenas a aparência das coisas, mas a essência de dominação permaneceu a mesma. Por isso Marx afirmou que o eixo de interpretação da História é a luta de classes, motivada por questões econômicas - razão pela qual sua teoria também foi chamada de materialismo dialético, opondo-se à adoção de princípios metafísicos para interpretar a História.

Marx conclui que a posse privada dos meios de produção é o fator primordial para promoção da desigualdade econômica e injustiça social, por concentrar riquezas nas mãos de poucos, excluindo as camadas populares que as produzem. A única maneira de sanar este mal é através da posse coletiva dos meios de produção – papel que cabe ao estado socialista idealizado por Marx, que traz a abolição da propriedade privada com o intuito de garantir a participação de todos na produção e usufruto das riquezas. Como a história demonstra a tendência à perpetuação do conflito de classes com a subjugação da massa que sustenta o sistema, Marx afirma que só haverá a mudança necessária para reverter a distribuição de poder e riqueza na sociedade através de uma revolução da classe trabalhadora, já que as elites não abdicam de seu poder.

O comunismo seria o passo final dado pela sociedade socialista amadurecida, onde a propriedade dos bens e riquezas seriam coletivos sem a necessidade de intervenção do Estado.

Convém lembrar que Marx desenvolveu suas teorias observando as condições miseráveis e subumanas de vida e trabalho dos operários de seu tempo e que o socialismo/comunismo não é necessariamente ateu (como comprovam vários religiosos que concordaram com sua teoria). Marx era  ateu e criticou acidamente os males de uma religiosidade vendida ao sistema.

Se, por um lado, posso concordar com Marx que cabe ao Estado ter um papel maior na garantia do bem comum de seus cidadãos (o capitalismo movido apenas pelo individualismo se torna selvagem e excludente – cabe a Estado garantir que a produção de riquezas seja acompanhada de responsabilidade social, ao contrário do que defende o neoliberalismo), mas não posso concordar com as restrições às liberdades individuais que suas teorias propõem, cujas consequências imediatas foram a censura e a matança nos países onde o socialismo foi implantado.

Qual a melhor alternativa, então?

Sugiro que adotemos o modelo da igreja primitiva.

"E perseveravam na doutrina dos apóstolos e na comunhão, no partir do pão e nas orações. Em cada alma havia temor; e muitos prodígios e sinais eram feitos por intermédio dos apóstolos. Todos os que creram estavam juntos e tinham tudo em comum. Vendiam as suas propriedades e bens, distribuindo o produto entre todos, à medida que alguém tinha necessidade. Diariamente perseveravam unânimes no templo, partiam pão de casa em casa e tomavam as suas refeições com alegria e singeleza de coração, louvando a Deus e contando com a simpatia de todo o povo. Enquanto isso, acrescentava-lhes o Senhor, dia a dia, os que iam sendo salvos" (Atos capítulo 2, versículos 42 a 47).

Não com base no pressuposto errôneo de alguns estudiosos que consideram a igreja primitiva o exemplo mais primitivo de uma sociedade comunista.

Não – a fantástica visão social daquela comunidade, que conseguiu erradicar a  pobreza de seu meio, não era fruto da coerção estatal, nem tampouco de um projeto coletivista.

Eram decisões individuais de pessoas que sabiam viver não só para si, mas também para o outro.

Este foi o grande erro de Marx: achar que um ideal de justiça pudesse ser alcançado através da coerção de um meio externo (o Estado ou o Partido), quando isto é possível somente através da transformação interior.

Os primeiros discípulos não eram comunistas: viviam em COMUNHÃO – e assim, passaram a considerar suas vidas como um espaço coletivo, destinado a promover o bem comum.

Tudo espontâneo, motivado pelo Evangelho.

Simples assim. E eficiente assim.

E neste modelo eu boto fé.

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*Para alguns críticos do comunismo, esta é uma grande contradição de Marx: se a dialética histórica exige a constante transformação da sociedade, não é possível sua cristalização em um clímax – logo, o comunismo estaria fadado a ser superado por outra forma de organização econômico/social.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

CARACTERÍSTICAS DO FALSO LÍDER

Estava estudando um pouco sobre a área de Recursos Humanos nesta tarde e tive a oportunidade de me deparar com o texto de Patrícia Bispo intitulado "10 Características do Falso Líder", ao visitar o site www.rh.com.br.

Guardadas as devidas proporções, o texto é perfeitamente aplicável aos meios eclesiásticos.  Segue abaixo um breve resumo de seus tópicos.

Leia e tire suas próprias conclusões!

10 CARACTERÍSTICAS DO FALSO LÍDER:

1. Acha que sabe tudo ou, na melhor das hipóteses, reconhece que precisa aprender - mas não com aqueles que integram seu time;

2. Resiste a qualquer programa de desenvolvimento de Lideranças;

3. Repudia parcerias;

4. Delega tarefas, cobra resultados e determina prazos, mas atrai para si todos os méritos e louros pelo trabalho executado;

5. Acha que todos cobiçam sua posição;

6. Considera comunicação interna perda de tempo;

7. Utiliza a agressão verbal como forma de "estímulo";

8. Não é acessível;

9. Sua equipe é a sua cara, ou seja, carrega em si as sequelas (físicas, psicológicas e espirituais) de estarem sob seu jugo;

10. Ao avaliar seus liderados, não consegue ver neles nenhuma qualidade, e enfatiza apenas as falhas.

sábado, 13 de novembro de 2010

SÉRIE SABERES ESSENCIAIS À VIDA (I): APRENDER A TRANSCENDER SEU TEMPO

Todo ser humano é um produto de seu tempo. Depara-se, ao nascer, com uma realidade que o antecedeu, e que constitui o arcabouço conceitual para sua formação, o pano de fundo de si mesmo.

Isto torna extremamente falível referir-se a qualquer pessoa sem levar em conta o contexto cultural que moldou sua cosmovisão.

Esta assertiva, que exige sensibilidade e empatia para analisarmos o legado deixado por outros (mormente das gerações passadas), não pode estar a serviço da previsibilidade.

Sim, pois apesar de todo ser humano ser produto de seu tempo, os seres humanos não são apenas fruto de seu tempo.

Todas as eras dão testemunho de homens e mulheres que, discernindo as imperfeições de seus dias, viveram à frente de seu tempo.

Se assim não fosse, a História não teria mobilidade e já teria se cristalizado - felizmente não é esta a realidade histórica, e disso dão testemunho os movimentos reformistas, abolicionistas, de direitos civis, de emancipação política.

As características de injustiça, desigualdade, intolerância, opressão e alienação religiosa não foram uma unanimidade, nas épocas em que mais assolaram a humanidade.

Isto só foi possível graças ao exercício da crítica sobre o próprio tempo, o que confere a capacidade de transcender ao tempo.

Abrir mão deste exercício significa não procurar visualizar possibilidades maiores e melhores de existência, abrindo mão do gerenciamento de si próprio.

É o conformismo como estilo de vida.

 É por isso que a advertênia de Paulo é tão relevante: "E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus". (Romanos 12.2)

Conhecer a vontade de Deus significa adquirir critérios para discernir e viver a vida que não estão sujeitos às limitações e temporalidade humanas.

Por isto não podemos aceitar viver uma vida de apatia, irreflexão e distanciamento de Deus - pois qual é a promessa deste tempo a nós?

Qual o perfil de ser humano que o século XXI, na sociedade brasileira pós-moderna nos apresenta?

Viver sob o signo do individualismo, consumismo e cinismo? Da indiferença, alienação, coisificação de si e dos outros e da sexolatria? Do niilismo e desesperança?

Reproduziremos tudo isto? 

Seremos retrato de nosso tempo ou, com a ajuda do Deus eterno, viveremos à frente de nosso tempo?

Que esta lição possa ser aprendida com muita urgência.

sábado, 6 de novembro de 2010

sexta-feira, 5 de novembro de 2010

DÍZIMO: ATO DE FÉ OU ATO DE AMOR?


Não foram poucas as vezes em que vi pessoas definirem o dízimo como um ato de fé.

Em primeiro lugar, reconheço que tal definição se tornou lugar-comum no meio evangélico, sendo usada de forma bastante corriqueira. Nem tampouco quero sugerir que todos que compreendem o dízimo desta forma o fazem por má-fe. Mas discordo de tal definição, por considerá-la extremamente nociva.

Por quê?

Porque quando o dízimo é definido como um ato de fé, as pessoas dizimam pela motivação errada: para receber mais em troca.

É a institucionalização da agiotagem para com Deus: dar agora, para depois Ele pagar com juros.

Na prática, esta é a "fé" que é suscitada através desta concepção do dízimo.

É por isso que prefiro definir o dízimo como um ato de amor.

Definir o dízimo como um ato de amor é defini-lo a partir de nossas motivações, ou seja, como expressão concreta de nossa solicitude com o Reino de Deus e solidariedade para com o próximo, e renúncia ao individualismo e materialismo.

Dentro de tal definição, o elemento “receber” não tem importância.

É nocivo definir o dízimo como um ato de fé porque fazer assim é defini-lo a partir de resultados – algo que é comprovado pelos inúmeros testemunhos de dizimistas, sempre enfatizando o retorno financeiro que obtiveram.

Nunca vi nenhum dizimista testemunhar acerca da simples alegria proporcionada por servir ao Senhor com seus recursos...

Por isso prefiro a definição oposta, pois creio que ela coloca o dízimo no lugar certo: como forma de cumprir o mandamento do Senhor (Marcos 12.29-31; 1Coríntios 13.3).  

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

SE EU TIVESSE SIDO UM BEATLE


Em 1980, em uma de suas últimas entrevistas (Revista VEJA, n.º 641, 17 de dezembro de 1980), John Lennon rechaçou mais uma vez a ideia de que os Beatles, já separados há 10 anos, se reunissem novamente - desta vez, recusando também a ideia de realizar shows filantrópicos, sugerida pelo jornalista que o entrevistou.

O músico era cético quanto a práticas de assistencialismo, além de discordar da ideia de que ele, pessoalmente, devesse ser responsável pela diminuição da pobreza no mundo.

“De onde as pessoas tiraram essa ideia de que os Beatles deveriam dar 200 milhões de dólares para a América Latina? Olha, os Estados Unidos já despejaram bilhões em lugares como esse. Não significou nada. Depois que os 200 milhões se forem o que acontecerá? É um círculo vicioso. Pode-se despejar dinheiro infinitamente. Depois do Peru, o Harlem; depois a Inglaterra. Não haverá um concerto.Teríamos de dedicar o resto da vida a uma excursão mundial, e eu não estou preparado para isso. Não nesta vida, pelo menos”.

Ao ler a entrevista, fiquei decepcionado com tal declaração, ainda mais porque a hipótese apresentada a John Lennon não era de todo infundada: a banda seria capaz de mobilizar grandes quantias para a flantropia - um dado facilmente constatável pela enorme rentabilidade da marca "Beatles" mesmo hoje, após 40 anos da separação da banda! 

Entäo, lamentei por não ter pessoalmente, como John Lennon, poder para reduzir sensivelmente a pobreza no mundo e fiquei imaginando como tudo seria diferente se eu estivesse no lugar dele.

Por instantes, desejei ter a mesma oportunidade que ele teve.

Mas isto é apenas devaneio.

Preocupante mesmo é a declaração de Ronald J. Sider em "O Escândalo do Comportamento Evangélico" (ed. Ultimato) de que apenas o dízimo da igreja americana seria renda privada suficiente para acabar com a miséria no mundo (pág. 22).

E como está sendo gasta essa grana...?

Lamento novamente, engulo em seco e tomo fôlego.

Tomo fôlego quando contemplo meu contexto particular de vida e as realizações que ele exige e ao mesmo tempo promete.

Mesmo sabendo que não tenho o mesmo potencial que outros teriam para realizar ações grandiosas (e não o fizeram), dentro do círculo que Deus me confiou sei que posso agir de forma legitimamente relevante, alcançando resultados significativos. 

O segredo não é o potencial em si, mas a responsabilidade que cada um assume diante de seu potencial, o que irá determinar a sua utilização.

Tomo fôlego e sigo em frente, enfim, porque concluo que Deus não vai nos julgar por quem não fomos, nem pelo bem que não tivemos oportunidade de fazer, mas por quem somos e como usamos os nossos talentos.